Estes dias estava ouvindo meu ipod e música vai, música vem, tinha esquecido, em meio a tantas outras, de uma que me toca muito. O nome: "Onde Anda Você" de Toquinho, Vinícius de Moraes e Hermano Silva. Fui pega de surpresa ao ouví-la sussurrando ao pé do ouvido e me encontrei pensando na poesia, na alma, na história que essa música traz, parando e aguçando bem os sentidos sou capaz de visualizar o momento e a tal boêmia.
Imagino a cena em que ele vaga por todos os lugares que costumava frequentar com ela e, cansado de tanto procurar, senta numa mesa mal iluminada, pede uma bebida e repassa repetidamente cada gesto, olhar que a moça um dia dedicou e se vê perdido naquele turbilhão de sentimentos, naquela dor gostosa de sentir.
Enfim, essa é a minha cena da música, mas ela me inspira tantas perguntas e comparações com os dias de hoje. Não vejo nenhum cidadão de 20 ou 30 anos capaz de sentir alguma coisa com tamanha intensidade, seria qualificado como "brega". No meu ponto de vista breguice é disperdiçar a vida sem sentir intensamente. Não vejo compositores capazes de externar os sentimentos dessa maneira e, sinceramente, boa parte das mulheres parece que deixou de entender ou perdeu mesmo o gosto pelo romantismo.
É triste constatar que a coisa se baseia em sair "rebolation" de uma relação para a outra, literalmente. Antigamente existia um compromentimento maior com as coisas que se vivia, hoje elas duram o tempo de um beijo e que venha o próximo, não se pode perder tempo.
Ainda bem que não estou sozinha, conversando com algumas amigas, mulheres diferentes, mas de valores semelhantes, vejo que não sou a única a questionar os limites dessa geração 20/30 e poucos, parece que o respeito é algo a ser conquistado arduamente, consideração é artigo em falta e lealdade é promessa de casamento. Valores que antigamente eram tão reais, tão presentes, parece que sairam das prateleiras, que deixaram de existir, só encontramos o significado deles nos dicionários, assim como as músicas que tanto dizem ficaram presas nos LPs.
Cada centímetro de uma relação era construído de maneira delicada, mostrar o ombro era sensual, o colo revelava um mistério praticamente infindável, o acesso aos joelhos era uma conquista de terrotório, uma noite tinha outra conotação, hoje tudo se resume a uma espécie de "vou te comer, vou te comer, vou te comer, vou te comer". Pode até comer, mas precisa palitar os dentes? Que deselegante!
Sem contar que está tudo à mostra já que "ela sai de saia e bicicletinha, uma mão vai no guidon e a outra tapando a calcinha", ainda bem que eu gosto mais de patins.
Os valores estão distorcidos, as composições são vulgares, assim como as relações. Acho que sou antiga, nem conheci Toquinho e muito menos Vinícius, mas sinto falta deles como se fossem meus melhores amigos e amantes, que saudade do romantismo boêmio, das conversas cheias de teorias, da poesia pela vida, de sentir e não ter vergonha, bons tempos aqueles.
Para ouvir e matar a saudade.
Uma releitura da Chapeuzinho Vermelho e do Lobo Mau.
Para rebolar.
Cuidado ao pedalar de saia.
Amando a humanidade
Há 9 anos